domingo, 20 de novembro de 2022

Tinha amor para oferecer.

Ofereci-o num mercado,

Mas amor não se vende num mercado,

E ninguém quis meu amor.


Tinha amor para oferecer.

Ofereci-o a quem não o queria,

Mas amor não se impõe a ninguém,

E ninguém quis meu amor.


Pensei que ofereceria amor

A alguém num mercado,

Impor amor a alguém,

E ninguém quis meu amor.


No entanto,

Se me foi imposto amor num mercado,

Se isso é certo, se isso é errado,

Se se sabe se isso é amor,

Não sei mais o que posso oferecer.


Mas meu coração

Partido num mercado,


Mas meu coração

Tantas vezes quebrado,


Mas meu coração que ignora,


Meu coração

Que já foi ignorado,


Entre tristezas e tristezas,


Se uma vez, puramente,

Puramente foi amado,


Valeu-me por todas as vezes

Que voltou comigo do mercado.

quinta-feira, 9 de junho de 2022

Meu receio não transmite sossego,
Meu silêncio não me aquece, e nego...
Quando trago sua mão ao meu peito
Com a convicção de que suspeito,
Quente a sensação, gelado o desejo,
Frio no coração, calor no beijo,
Cálculos tão frios, tão quentes enganos,
Todos derretidos pelos anos...
Sofro sem sofrer, mas sofro assim mesmo.
Eu medito quando queimo a esmo.

Este desespero não me abandona,
Não sou o Romeu de Verona...
Mas a Primavera canta aquecida,
Excita os invernos da vida.
Não é do olhar frio que brota a tristeza,
Senão do calor da beleza
Quando ergo minhas mãos para o céu.
É triste o anil do seu véu
Quando meu olhar não tem endereço -
Só vejo este teto de gesso.

quarta-feira, 30 de março de 2022

Surge sobre tudo o que eu vejo,
Como ataca a soja o percevejo -
Como suga a soja o percevejo
Ceifa a vida a Morte sem manejo.
Já que nunca foi qualquer segredo,
Surge para todos que têm medo -
Colhe a Morte todos que têm medo -
Ceifa a vida a Morte, tarde ou cedo.
Pode o sol brilhar, por ser estrela,
   Pode anoitecer, pode tardar,
   Pode o assassino nos sangrar...
Sob o sol virá, como costuma,
Nuvem branca, branca nuvem, branca...
Tinta branca em tela que foi branca...
Manche a tela branca a branca tinta.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

O reflexo do que vejo,
Eu desejo,
Sou eu ali, refletido,
Sou animal sonolento,
Mas o vento,
Mas o vento vinha vindo.
Sou eu ali, preparado
E parado,
Minhas mãos foram atadas,
Os meus pés estão descalços,
Meus pedaços,
Meus pedaços nas calçadas...
O reflexo do que vi,
Eu vivi
Enquanto o vento soprava,
Não estava preparado,
Fui levado,
Fui levado, pois levava...
Em seguida, vem a chuva,
Que renova,
Em seguida, a correnteza
Rompe o que o peito perdeu,
E rompeu,
E rompeu minha represa.

sábado, 18 de dezembro de 2021

 Eu acho que perdi o que ganhei,

Mas a ninguém importa o que eu achar.

Eu acho que não sei mais me importar,

Se devo perder, só eu perderei.


Se mereço vencer, perdoarei

Esta vontade louca de ganhar,

O título a vencer me tira o ar,

Mesmo vencendo, nunca vencerei.


Serei um perdedor mal humorado

Após tudo explicado e anunciado,

Hipócrita serei, se desmentir,


Que minto, que não quero mais vencer,

Que não me abalo mais quando perder.

Na verdade, não tenho aonde ir...

sexta-feira, 17 de dezembro de 2021

 Sonhei que meu presente se quebrou...
Meu próprio sonho, meu sonho querido,
Caiu das mãos inábeis do bandido,
O meu sonho outro sonho me tomou.

Sonhei que um novo sonho se formou.
Nos sonhos, tudo faz todo sentido.
Sonho abrangente, sonho resumido,
Um presente me trouxe e me tirou.

Não sei o que fazer com os pedaços,
Não sei o que pensar do que ganhei.
O sábio diz que devo agradecer...

Meus sonhos atam nós nos meus cadarços,
Eu amarro o que fui ao que serei.
Tudo pode ser sonho e pode ser.


segunda-feira, 19 de julho de 2021

Mate nesta fonte a sede e sangre o morto.
Muitos desta fonte em vão beberam, ávidos.
Doidos vinham, doidos iam... Somem... Pronto...
Bocas secas, febres, rostos brancos, pálidos...
Muitos deles sofrem dores fortes - muitos! -
Muitos deles não sorriem nunca mais,
Muitos deles não vieram quando prontos,
Muitos bebem pouco, pouco é demais,
Poucos sabem, mas ninguém explica nada,
Quem explica sem saber explica tudo,
Mais explica a gente em voz sem voz, calada.
Deixem para o tolo o som vazio do todo,
     Pois a fonte esgota o novo e o velho fogo,
     Pois a fonte é o fogo, seu forte afago.