sábado, 27 de julho de 2013

Atalhado

"Não imagina meus tantos carinhos",
sussurrou num ouvido meu, e riu,
ao virar-me, ao fitá-la. "Nós sozinhos
estamos neste frio, puta o pariu!"

"Tantas putas esfriam nos caminhos
onde tantos procuram seu calor,
querida", respondi-lhe, "e que mais frio
que o cobre recebido do doutor?"

"Escapa dos doutores o moral
se faço-os descer seu sangue ao pau,
se imaginam como fá-los-ei",
respondeu-me. Vencido, concordei.

segunda-feira, 8 de julho de 2013

Sesta (em jejum)

And all I loved, I loved alone.
(Edgar Allan Poe)

Assista ao Meia-noite em Paris hoje
Com a testa de febre quente. Os olhos
A faiscar as órbitas. Bafeje
A boca em intervalos. Vis atalhos

Encurtem dos aromas sua sege
Desde a cozinha. Desde a rua. Desde
O quintal. Desde a sala... Do capim...
A trepadeira pisa essa parede.

(Como pode, deitado, ver da fresta
Na janela. Pequena fresta aberta).
Pequena sonolência. Segue o filme.
Segue o sonho. Desperta; e está com fome...

terça-feira, 11 de junho de 2013

Branca flor

Ao contemplarmos ouro --e diamantes--
--Repara-- o tempo passa, e seu valor
Saltava-nos aos olhos há instantes
--Pincelados de tão perfeita cor.

A cor da branca flor fenece antes...
Debruça-se, lamenta-se e então cai.
--Também nós lamentamos ser passado
O tempo da açucena que se vai...

Ao relermos das vidas os resumos
--Repara-- o tempo passa, e perseguimos,
Como Layne no verso da canção
Diz, mentiras em erros de impressão.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Se me diz

Desejava saber ser a verdade,
Se me diz que me diz do coração
--Que juntos tomaremos a cidade--,
Mas sei que (se me diz) me diz em vão.

Desejava buscar felicidade.
Ao menos seus olhares fossem puros
Eu vê-la-ia enorme e enternecia,
Mas sei que me abandona nos apuros.

As mulheres não são imaculadas,
As oportunidades calculadas
Longe verá que a bomba me explodiu
--E a puta fingirá que não me viu.

sexta-feira, 7 de junho de 2013

Moleque

Algum tempo atrás pude ser moleque,
Moleque irresponsável, distraído,
E que a fonte dos gozos também seque
Não suspeitei a tempo, fui banido,

Adeus, Terra do Nunca! Ser moleque,
Quem diria, tem data pra expirar!
Onde tudo da vida tem seu prazo
Não há encarregado de acordar

Pra vida quem não quer ser acordado,
Infelizmente... Tolo e descuidado
Algum tempo atrás fui, fui negligente:
Quem é que me acordou tão de repente?

quarta-feira, 5 de junho de 2013

Bagagens

Mariposa, mariposa,
Tu vais queimar tuas asas!
(Casimiro de Abreu)

Eu próprio carreguei minhas bagagens.
Sofri sozinho o peso do pesar
De carregar cá dentro tais bobagens
Até nada restar para ocupar.

Eu próprio viajei minhas viagens
Carregado do medo e da esperança
Até que essa esperança torna medo
Que me virá vergar e que me vença.

Até que essa esperança torna dúvida
Nas expressões da minha cara estúpida
(Enquanto eu carregar sem perceber
Que nada já me resta que perder).

quarta-feira, 22 de maio de 2013

O percevejo

O voo sensual do percevejo
A procurar faminto a planta e planta
A seiva nutritiva com seu beijo
Para deixar de sê-lo, haja tanta.

O beijo do faminto percevejo...
A voar por incertas direções
Quais se vê padecerem maus amores
Os tolos, insensatos corações.

Sem reparar arrisca em voo falto
E pousa um coração de amor repleto,
Desses, em murcha planta colocada
Por quem lhe suga amor sem lhe dar nada.

sábado, 11 de maio de 2013

Sob custódia

Pelos cabelos preso por Atraso
desde menino estive --sob custódia.
Deste rei outro servo; outra paródia
doutro entrecho; falhado; um outro acaso.

Às vezes, empurrava-me a Descaso
quem me contava tretas de Concórdia;
e em lugar desta, amigo de Discórdia
a mais e mais tornei-me. A haver azo

e permissão deixava-me esquecer,
ora com uma, ora com o outro;
mor do tempo distante dos honestos

cresci; afeito a errar, não a vencer...
Precipitado já em negro báratro...
Quem cá descer recolha, pois, meus restos.

quinta-feira, 2 de maio de 2013

Linda violeta

Linda violeta,
Derrama-me      
Lágrima perfeita;
Conforma-me

Nome e sobrenome.
Recôndita,
Linda violeta,
Derrama-me

(Desde que escorreita,
Incólume)
Lágrima que, afeita,
Afeita-me,
Linda violeta!

terça-feira, 23 de abril de 2013

Tribulações de Garrastazu Iturrusgarai (coroa de sonetos)

E o veneno se sorve a longos tragos
Nos seios brancos e nos lábios frios
     Das lânguidas Frinés!
(Casimiro de Abreu)


1.
O predador em falsa, falsa pele
Pode ser seu parceiro de sinuca
Porque não pôde ver maldade nele,
Porque não pode ver maldade, nunca.
Não lhe pode esquecer a sua sorte,
Não vá por onde é frio e perigoso,
Não busque, a aflição nunca se repete,
Não lhe faz bem seu caldo venenoso.
Então mude os temperos da comida,
Um outro mais sagaz é quem lhe diz,
"Para ser liberado das correntes,
Para cicatrizar essa ferida
Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz"...
Num sorriso mostrou o fio dos dentes.

2.
Num sorriso mostrou o fio dos dentes
Da menina sentada só na guia.
Só na guia sentada ela sorria,
E sorriam, também, e tão brilhantes
Os seus olhos ciganos, e contentes,
A planejar maldades. Dia a dia,
Só na guia sentada prosseguia.
Seus poderes sorriam, e pungentes
Consequências calculam. Pobre dele
Que voltar o olhar, que descuidar,
Que apreciar meninas nas calçadas,
A sós, nas guias, doidas e malvadas,
A esperar, a fingir, a simular...
O predador em falsa, falsa pele.

3.
O predador em falsa, falsa pele,
A ocultar maldades, aproxima-se
Dele, que não suspeita a quem a prece
Sua chega, que não sabe quem dele
É próximo, mas mau, que o mal é próximo,
E mais próximo é, e mais exato,
Conforme o dia deita luz ao fato,
Conforme as horas passam, do seu termo,
O seu termo mais triste, mais sofrido,
Mais triste termo nunca tenha havido
De ninguém a ninguém, e desde nunca.
Volte a atenção ao próximo, portanto,
Que jogará mil almas contra o vento.
Pode ser seu parceiro de sinuca...

4.
Pode ser seu parceiro de sinuca,
Pode dar boas tardes, boas noites,
Bons dias, boas vidas, boas mortes,
Pode parecer bom enquanto peca,
Parecer ter o dote de Rebeca,
A tentar lamber outros belos dotes
(E, claro, não refiro seus lingotes
Mas, sim, ao que a luxúria sempre toca).
É verdade. Não olhe tão pasmado,
Que me pasma que não saiba a verdade,
Que tenha de ser eu quem lha revele
Porque insiste em estar tão retardado,
Porque ainda imagina uma bondade,
Porque não pôde ver maldade nele.

5.
Porque não pôde ver maldade nele
Não suspeitou de sua traição.
A intuição sugere e não impele,
Mas faz salientar a indecisão.
Infeliz é quem não sabe o caminho,
Engana-se quem não possui visão,
Imprudente é quem não pensa sozinho,
Nem pode ver, nem todo, nem fração.
Mas ágeis carcarás, mui violentos,
Não soem recear, nem vacilar,
Nem fazem caso quando alguém se invoca,
E não receberão quaisquer lamentos,
Nem os abalará, se espernear
Porque não pode ver maldade, nunca.

6.
...Porque não pode ver maldade, nunca,
Irá sentir abrir-lhe a carne a faca,
E verá que se riem da ferida,
E que se riem mais, se é mais sofrida,
Demais, o sofrimento em sua vida
Tornar-se-á canção de mais querida
Da gente que festeja a violência.
(Mais, se, demais, vertida. Paciência).
Cativante e formosa seja a noite
Sem lua por que voam pirilampos
No verão a brilhar em alagados
Brejos, e espessos bosques, e calados
Cerrados, e perdidos pelos campos,
Não lhe pode esquecer a sua sorte.

7.
Não lhe pode esquecer a sua sorte
Se vierem tocar-lhe os resultados
Por todas as balizas. Vêm a trote,
E vêm para aparar os descuidados
Que surgem em seu caminho. Para leste,
Se para oeste vão, atrapalhados,
Se para o leste vão, surgem do oeste,
Vão-se, do norte ao sul, desnorteados.
Sempre o perdido atrai o que o encontre,
Sempre o covarde o fraco sempre ataca,
Sempre é certa a maldade, desde o ventre:
Tão cedo o possa, seja cauteloso,
Ande por sobre a terra firme e seca,
Não vá por onde é frio e perigoso.

8.
Não vá por onde é frio e perigoso
A tentar emular um corajoso,
Sem atrasos será um idiota,
E talvez findará em chão sem volta,
Em terra onde a coragem será morta,
Em terra onde o vilão ninguém o peita,
Em terra onde o valente, mal nasceu,
Fundo furou buraco e se escondeu.
Chorará em lamento tal, ridículo,
Que fará ser ridículo batê-lo
A quem o vem bater, quem o cacete.
Não tem de ser Aquiles, grego heroico,
Não importa se escutam o seu eco,
Não busque, a aflição nunca se repete.

9.
Não busque, a aflição nunca se repete,
Depois que aflições há pouco lhe fica
Além de um mau humor que não se explica,
Do cansaço dos cem aos vinte e sete,
Dos reflexos confusos, das difusas
Reflexões, do reflexo desse velho
Que todas as manhãs vê nesse espelho,
De expressões aflitivas, sós, obtusas;
Que causa o espanto a não querer olhá-lo?
Carcaça tão nojenta não há tal,
Por que representar tamanho abalo?
Não se concebeu mal tão poderoso,
Só sua covardia é anormal,
Não lhe faz bem seu caldo venenoso.

10.
Não lhe faz bem seu caldo venenoso
De mentiras cozidas, digeridas,
Mentiras peçonhentas, muito ardidas,
Fantasias, patranhas, seu cremoso
Caldo de decepção muito afamado
Entre aqueles que muito sentem fome
Por não sentirem fome tal quem come
Da verdadeira fome motivado.
A verdade abrirá seu apetite,
Desatravancará o seu espírito,
Curará sua mente da gastrite
Em que sua dieta empobrecida
Lançou-a a padecer. Está contrito?
Então mude os temperos da comida.

11.
Então mude os temperos da comida,
O estilo da camisa, o penteado,
O perfume, o calção, e o seu calçado,
E, fundamental, mude sua vida
Nos detalhes de lado das vitrinas,
Nas fibras que coseram com esmero
O amor (que desprendeu o desespero,
De si) ao seu lugar devido, apenas
Para deixar tristezas para trás,
De modo inapelável e irrevogável,
Cortar todos os tês, pingar nos is
Todos consigo próprio, fique em paz,
Que vibre o coração nota aprazível,
Um outro mais sagaz é quem lhe diz.

12.
Um outro mais sagaz é quem lhe diz
As palavras que não vou mais ouvir,
E, assim, não restar mais infeliz,
E, se quer dizer, diga quando ir
Daqui, donde saudades não terei,
Donde saibam enormes essas dores
Das saudades, que nunca as sentirei
Por volverem, em raivas, em rancores
Que rodopiam, mortos-vivos lentos,
Que ritualizaram sua marcha,
Mas já veem meus olhos indolentes
Fatigarem-se tanto dos tormentos,
Tanto, que o corpo todo se relaxa
Para ser liberado das correntes.

13.
Para ser liberado das correntes,
Para pô-las de lado, e prosseguir
Sem nada que ver, nada ter que ouvir,
Nada de tristes quadros ou sons tristes,
Não ter de chorar, não ter de sorrir,
Sem dias semelhantes, diferentes
Dias tampouco, não mais ouvir chistes,
Não mais recuar, nunca em frente ir,
Nada de recepção nem de partida,
Nem aceleração, e nem frenagem,
E nem Lua conjunta, nem oposta,
Desnecessária, a busca da resposta,
Só precisa de tempo e de coragem
Para cicatrizar essa ferida.

14.
Para cicatrizar essa ferida
Que o fez sangrar, não tema o próprio sangue,
Tenha-a estancada. E tenha exangue,
E tenha já vencido, e já sem vida,
Quem segura o punhal que a provocou,
Que não é sabedor quem não é rápido,
Quem poupa um inimigo porco, esquálido,
Da ira que ele próprio originou.
A quem atira flechas mostre o escudo,
A quem não obedece tenha mudo,
A quem quer a caneta dê um giz;
Antes busque a vingança que o perdão,
Antes cruel carrasco que a ilusão
Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz.

15.
Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz,
Fez o que bem queria como o quis
Por bem, e trouxe o mal, e olhou a quem,
Sem o cobrir de nada, de ninguém,
E fez com que rodasse, barulhento,
Soprado turbilhão frio, violento,
E neste vê estar montada a Morte,
Que atende quem a chama desta sorte,
Com quem ninguém pondera, nada ou tudo,
Pois tudo a Morte soube deste mundo,
Da Morte não se esconde consequentes...
Se a Morte então pegar da sua mão,
Revelar sua face, veja, irmão:
Num sorriso mostrou o fio dos dentes...

Nunca se repete

O predador em falsa, falsa pele
Pode ser seu parceiro de sinuca
Porque não pôde ver maldade nele,
Porque não pode ver maldade, nunca.

Não lhe pode esquecer a sua sorte,
Não vá por onde é frio e perigoso,
Não busque, a aflição nunca se repete,
Não lhe faz bem seu caldo venenoso.

Então mude os temperos da comida,
Um outro mais sagaz é quem lhe diz,
"Para ser liberado das correntes,

Para cicatrizar essa ferida
Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz"...
Num sorriso mostrou o fio dos dentes.

Turbilhão frio

Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz,
Fez o que bem queria como o quis
Por bem, e trouxe o mal, e olhou a quem,
Sem o cobrir de nada, de ninguém,

E fez com que rodasse, barulhento,
Soprado turbilhão frio, violento,
E neste vê estar montada a Morte,
Que atende quem a chama desta sorte,

Com quem ninguém pondera, nada ou tudo,
Pois tudo a Morte soube deste mundo,
Da Morte não se esconde consequentes...

Se a Morte então pegar da sua mão,
Revelar sua face, veja, irmão:
Num sorriso mostrou o fio dos dentes...

segunda-feira, 22 de abril de 2013

Cruel carrasco

Para cicatrizar essa ferida
Que o fez sangrar, não tema o próprio sangue,
Tenha-a estancada. E tenha exangue,
E tenha já vencido, e já sem vida,

Quem segura o punhal que a provocou,
Que não é sabedor quem não é rápido,
Quem poupa um inimigo porco, esquálido,
Da ira que ele próprio originou.

A quem atira flechas mostre o escudo,
A quem não obedece tenha mudo,
A quem quer a caneta dê um giz;

Antes busque a vingança que o perdão,
Antes cruel carrasco que a ilusão
Que o marcou, machucou, fê-lo infeliz.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Busca da resposta

Para ser liberado das correntes,
Para pô-las de lado, e prosseguir
Sem nada que ver, nada ter que ouvir,
Nada de tristes quadros ou sons tristes,

Não ter de chorar, não ter de sorrir,
Sem dias semelhantes, diferentes
Dias tampouco, não mais ouvir chistes,
Não mais recuar, nunca em frente ir,

Nada de recepção nem de partida,
Nem aceleração, e nem frenagem,
E nem Lua conjunta, nem oposta,

Desnecessária, a busca da resposta,
Só precisa de tempo e de coragem
Para cicatrizar essa ferida.

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Olhos indolentes

Um outro mais sagaz é quem lhe diz
As palavras que não vou mais ouvir,
E, assim, não restar mais infeliz,
E, se quer dizer, diga quando ir

Daqui, donde saudades não terei,
Donde saibam enormes essas dores
Das saudades, que nunca as sentirei
Por volverem, em raivas, em rancores

Que rodopiam, mortos-vivos lentos,
Que ritualizaram sua marcha,
Mas já veem meus olhos indolentes

Fatigarem-se tanto dos tormentos,
Tanto, que o corpo todo se relaxa
Para ser liberado das correntes.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Deixar tristezas

Então mude os temperos da comida,
O estilo da camisa, o penteado,
O perfume, o calção, e o seu calçado,
E, fundamental, mude sua vida

Nos detalhes de lado das vitrinas,
Nas fibras que coseram com esmero
O amor (que desprendeu o desespero,
De si) ao seu lugar devido, apenas

Para deixar tristezas para trás,
De modo inapelável e irrevogável,
Cortar todos os tês, pingar nos is

Todos consigo próprio, fique em paz,
Que vibre o coração nota aprazível,
Um outro mais sagaz é quem lhe diz.

Verdadeira fome

Não lhe faz bem seu caldo venenoso
De mentiras cozidas, digeridas,
Mentiras peçonhentas, muito ardidas,
Fantasias, patranhas, seu cremoso

Caldo de decepção muito afamado
Entre aqueles que muito sentem fome
Por não sentirem fome tal quem come
Da verdadeira fome motivado.

A verdade abrirá seu apetite,
Desatravancará o seu espírito,
Curará sua mente da gastrite

Em que sua dieta empobrecida
Lançou-a a padecer. Está contrito?
Então mude os temperos da comida.

terça-feira, 16 de abril de 2013

Reflexos confusos

Não busque, a aflição nunca se repete,
Depois que aflições há pouco lhe fica
Além de um mau humor que não se explica,
Do cansaço dos cem aos vinte e sete,

Dos reflexos confusos, das difusas
Reflexões, do reflexo desse velho
Que todas as manhãs vê nesse espelho,
De expressões aflitivas, sós, obtusas;

Que causa o espanto a não querer olhá-lo?
Carcaça tão nojenta não há tal,
Por que representar tamanho abalo?

Não se concebeu mal tão poderoso,
Só sua covardia é anormal,
Não lhe faz bem seu caldo venenoso.

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Lamento tal

Não vá por onde é frio e perigoso
A tentar emular um corajoso,
Sem atrasos será um idiota,
E talvez findará em chão sem volta,

Em terra onde a coragem será morta,
Em terra onde o vilão ninguém o peita,
Em terra onde o valente, mal nasceu,
Fundo furou buraco e se escondeu.

Chorará em lamento tal, ridículo,
Que fará ser ridículo batê-lo
A quem o vem bater, quem o cacete.

Não tem de ser Aquiles, grego heroico,
Não importa se escutam o seu eco,
Não busque, a aflição nunca se repete.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Do norte ao sul

Não lhe pode esquecer a sua sorte
Se vierem tocar-lhe os resultados
Por todas as balizas. Vêm a trote,
E vêm para aparar os descuidados

Que surgem em seu caminho. Para leste,
Se para oeste vão, atrapalhados,
Se para o leste vão, surgem do oeste,
Vão-se, do norte ao sul, desnorteados.

Sempre o perdido atrai o que o encontre,
Sempre o covarde o fraco sempre ataca,
Sempre é certa a maldade, desde o ventre:

Tão cedo o possa, seja cauteloso,
Ande por sobre a terra firme e seca,
Não vá por onde é frio e perigoso.

segunda-feira, 8 de abril de 2013

Formosa seja a noite

...Porque não pode ver maldade, nunca,
Irá sentir abrir-lhe a carne a faca,
E verá que se riem da ferida,
E que se riem mais, se é mais sofrida,

Demais, o sofrimento em sua vida
Tornar-se-á canção de mais querida
Da gente que festeja a violência.
(Mais, se, demais, vertida. Paciência).

Cativante e formosa seja a noite
Sem lua por que voam pirilampos
No verão a brilhar em alagados

Brejos, e espessos bosques, e calados
Cerrados, e perdidos pelos campos,
Não lhe pode esquecer a sua sorte.

sábado, 6 de abril de 2013

Não fazem caso

Porque não pôde ver maldade nele
Não suspeitou de sua traição.
A intuição sugere e não impele,
Mas faz salientar a indecisão.

Infeliz é quem não sabe o caminho,
Engana-se quem não possui visão,
Imprudente é quem não pensa sozinho,
Nem pode ver, nem todo, nem fração.

Mas ágeis carcarás, mui violentos,
Não soem recear, nem vacilar,
Nem fazem caso quando alguém se invoca,

E não receberão quaisquer lamentos,
Nem os abalará, se espernear
Porque não pode ver maldade, nunca.

sexta-feira, 5 de abril de 2013

Não olhe tão pasmado

Pode ser seu parceiro de sinuca,
Pode dar boas tardes, boas noites,
Bons dias, boas vidas, boas mortes,
Pode parecer bom enquanto peca,

Parecer ter o dote de Rebeca,
A tentar lamber outros belos dotes
(E, claro, não refiro seus lingotes
Mas, sim, ao que a luxúria sempre toca).

É verdade. Não olhe tão pasmado,
Que me pasma que não saiba a verdade,
Que tenha de ser eu quem lha revele

Porque insiste em estar tão retardado,
Porque ainda imagina uma bondade,
Porque não pôde ver maldade nele.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

É próximo

O predador em falsa, falsa pele,
A ocultar maldades, aproxima-se
Dele, que não suspeita a quem a prece
Sua chega, que não sabe quem dele

É próximo, mas mau, que o mal é próximo,
E mais próximo é, e mais exato,
Conforme o dia deita luz ao fato,
Conforme as horas passam, do seu termo,

O seu termo mais triste, mais sofrido,
Mais triste termo nunca tenha havido
De ninguém a ninguém, e desde nunca.

Volte a atenção ao próximo, portanto,
Que jogará mil almas contra o vento.
Pode ser seu parceiro de sinuca...

quarta-feira, 27 de março de 2013

O sorriso só

Num sorriso mostrou o fio dos dentes
Da menina sentada só na guia.
Só na guia sentada ela sorria,
E sorriam, também, e tão brilhantes

Os seus olhos ciganos, e contentes,
A planejar maldades. Dia a dia,
Só na guia sentada prosseguia.
Seus poderes sorriam, e pungentes

Consequências calculam. Pobre dele
Que voltar o olhar, que descuidar,
Que apreciar meninas nas calçadas,

A sós, nas guias, doidas e malvadas,
A esperar, a fingir, a simular...
O predador em falsa, falsa pele.

sábado, 23 de março de 2013

Aborto



Quem sabe dizer
Ao meu entender
Que quero saber
Dizer, 'é mentira'?

Mentira que atalha
A verdade; valha
Doída navalha
A sangrar calotes.

Se o souber, avise
O próprio Diabo.

quinta-feira, 21 de março de 2013

Com amor dedico

Com amor dedico o ódio
Das palavras desgraçadas
Da sujeira desta boca
Que lhe fala (uma cloaca).

Com amor dedico o ódio
Do passar do tempo a ser
Ordinário nessa vida
De ninguém de repetida.

Com amor dedico o ódio
Do trabalho sem salário
Do sossego (ou da preguiça),
Da ideia sem premissa.

Com amor dedico o ódio
Da assunção imerecida
Da vadia ao Paraíso
(A serpente agita o guizo).

Com amor dedico o ódio
Do esplendor só das estrelas.
Tão gratuito quanto belo,
Cru, eterno, sem abalo.

Com amor dedico o ódio
Das suspeitas motivadas
Por razões imotivadas
Das pessoas paranoicas.

*

Com amor dedico o ódio
De sonhar parte do sonho,
Mas do sonho não ser parte,
Não ser todo, não ser arte.

Com amor dedico o ódio
Do suspense do passado
Que se não acontecesse
Talvez nunca regressasse.

Com amor dedico o ódio
Da demora do momento
Da derrota decisiva
Dessa espera corrosiva.

Com amor dedico o ódio
Da contínua oração
Aos descalços servidores
Que não passa dos pastores.

Com amor dedico o ódio
De cegar minhas pupilas
Com a brasa das auroras
Das --mil vezes-- mesmas horas.

Se existiu um porco pérfido,
Certamente não fui eu.
Se o quiser, é todo seu,
Com amor dedico,
                                 Ódio

quinta-feira, 14 de março de 2013

Apague todas as lembranças


 Um soneto muito antigo. Achei em uma pen drive, aqui...



Apague todas as lembranças
(Essas lembranças desastrosas);
Perdidas são as esperanças
(São prostitutas mentirosas).

Aguardo minha condução
Porque me resta, é, aguardar;
Porque não faço mais questão
Alguma, não, de demorar.

Risquei a giz, no chão, seu nome...
Um nome lindo pareceu-me
E, desde o chão, chegou-me ao peito.

Apesar disso vou-me embora
Porque meu peito exclama agora:
--Não risque mais, eu não aceito!

segunda-feira, 11 de março de 2013

Saídas - 9

- Cara, tens certeza de que fazemos certo? Parece-me estranho...

- Acalma-te. Um pato disse tudo o que precisamos construir.

- Esse pato tinha a cabeça verde ou vermelha?

- Vermelha.

- Merda!

sábado, 9 de março de 2013

Saídas - 8

Os subúrbios dos Estados Unidos têm várias personagens típicas.

Esta mãe que prepara uma torta de maçã, por exemplo. Logo seu filho entrará; e interrompê-la-á:

- Oi. >snif< >snif<. Sloth gosta Babe Ruth. Sloth gosta de torta de maçã.

Ela volta ao que fazia antes...

- Sabe que não conheço os lugares de onde tira essas coisas estranhas.

- Porque é uma padawan indisciplinada.

- E todas as vezes que eu aviso de novo continua até eu estar irritada.

- Tudo bem (desde que a irritação não a faça pedir para eu lavar a louça depois de comer a minha preciosa).

- A louça é sua.

- Odeio lavar a louça...

- Alguém gosta?

- Você.

- Eu só lavo porque é necessário. Ou compramos outras panelas, formas e talheres todas as vezes que o Sloth quiser comer o precioso padawan.

- Ao contrário. Gosta, sim. Posso provar o que digo.

- Ilumine-me.

Ele hesita... As órbitas querem ler algo interessante nas retinas, mas não podem...

- Bom, quem falou foi a empolgação... Mas garanto que eu levo a sério evitar aquilo que não gosto muitas vezes mais que você. Evidência disso é que enfrento as broncas, olhares, indiretas etc.; e, assim mesmo, continuo firme.

Uma gota de cinismo iniciou um sorriso em um canto de seus lábios.

A mãe para, e volta o corpo para a direção do filho. Ela adivinhou a expressão em seu rosto porque a viu uma ocasião ou outra.

- O quê; pensa que é o Calvin apenas por também falar sozinho?

- Ah! Agora a senhora sabe usar citações populares...

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Saídas - 7

- O senhor pode estimar o valor das mercadorias roubadas do museu?

- Você poderia estimar o valor de sua mãe?

- R$ 620,00.

- O quê?

- É, mais ou menos, o preço de um Playstation 3...

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Saídas - 6

TAP! Tudo bem. Tudo terminou bem rápido. Você está morta agora, Formiga.

Nada aconteceu por motivos pessoais. A verdade é que a última vez que nos encontramos é também a primeira. Curioso.

Estavámos os dois a cuidar tranquilamente dos interesses próprios como seres vivos decentes que tenho a certeza de que somos. Bem, agora não é. Foi.

É errado pensar que posso matar qualquer bicho que esteja a trilhar por minhas costas sem causar nenhum mal, mas aí vêm as ideias...

Diga-se que enquanto anda encontra qualquer coisa em minha pele que o interessa. A ideia então surgiu. Diga-se novamente que o interesse provocado é forte o bastante para libertá-la. A ideia. Que aconteça.

Eu terei o incômodo ácido fórmico. Não posso permiti-lo.

Ideias são perigosas... Causam mortes...

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quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Saídas - 5

Um garoto sentia-se triste porque havia muito tempo somente andava por um corredor escuro.

Ele chegou finalmente em um campo de capim a brotar onde uma santa bárbara enorme fazia sombra perfeito para deitar a cabeça e contemplar as nuvens. O tempo era ameno.

Durante o descanso o barulho irritante dos insetos a voar por ali...

Sem revisar a atitude tomou e executou a decisão de voltar pelo corredor por que viera. E disse:

- Não era ruim assim. Não exagere.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Saídas - 4

Dois amigos estavam sentados em uma varanda em silêncio até um deles começar a tentar conversar com o outro. Ele disse:

- Um recente estudo descobriu que lesmas produzem uma coisa que é um ótimo cosmético para a pele.

Seu amigo então respondeu:

- Escute. Eu ainda não posso aceitar que seja verdade. Não antes de examinar os nomes dos pesquisadores envolvidos. Para ter certeza de que é um estudo sério.

Intrigado, o outro amigo disse:

- Posso presenciar o método utilizado para conseguir essa confirmação? Acredito ter muita utilidade para mim no futuro.

A resposta que obteve foi a seguinte:

- É natural que sim. É na realidade muito simples: se um dos pesquisadores tiver o sobrenome JENKINS o estudo foi criterioso (e não se vem de Massachusetts-Ohio-Oregon-Harvard-Berkeley como é o pensamento mais comum).

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Saídas - 3

Um defunto soube do sucesso que outro, Brás Cubas, obteve com a publicação de um volume. Todo o Além conhecia-o. Então começou a lembrar de sua vida:

- Por onde posso começar? Nunca consegui ficar rico. Não me casei nem tive filhos. Não me lembro de alguma aventura em que eu estivesse presente...

Ele percebeu que sua vida foi sempre muito tediosa. Era melhor desistir. Concluiu:

- É, o acontecimento de mais destaque de minha existência foi ser enterrado com a roupa de baixo sem nenhum furo.


segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Saídas - 2

Um profeta é colocado em frente ao rei.

Este rei tinha-se tornado pai pela primeira vez havia uma semana.

- Tenho uma visão, iniciou o porta-voz da administração dos campos santos, ela refere o recém-nascido príncipe.

Os presentes ficaram apreensivos depois de ouvirem essas palavras.

Ele continuou, após brevíssima pausa, Agregado:

- Se ainda viver no castelo quando for adulto será um grande rei como seu pai. Se, por outro lado, abraçar a vida religiosa quando crescer será o salvador do mundo.

Supõe-se que nem profetas podem ignorar todo o tempo a política.

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sábado, 5 de janeiro de 2013

Saídas

Dois amigos andam por uma rua qualquer de comerciantes.

Eles ouvem em certo momento de dentro de uma das lojas um homem aos gritos:

- UM PREGO FORA DO LUGAR DEVE SER MARTELADO DE VOLTA!

Depois de entreolharem-se com o mesmo semblante pensativo um diz ao outro, calmamente:

- Ele com certeza é fascista... Ou é marceneiro.

 Seu amigo balança a cabeça em sinal afirmativo. E então diz:

- Sinto vontade de tomar saquê, mas não sei por quê.

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